Introdução e Metodologia
Na última década, o enoturismo tornou-se uma vertente dinâmica e rentável de muitas empresas produtoras de vinho, criando novos empregos, as comunidades locais, a sustentabilidade e o património. No entanto, a falta de dados internacionais consistentes tem dificultado a formulação de políticas e estratégias empresariais baseadas em evidências. O Global Wine Tourism Report 2025 constitui por isso, o primeiro relatório internacional com base suficientemente ampla e sólida que permita ter um conhecimento aprofundado sobre a atividade à escala global apresentando uma visão abrangente do estado atual e tendências do enoturismo mundial. Foi elaborado pela Hochschule Geisenheim University, em colaboração com UN Tourism, OIV – Organização Internacional do Vinho, Great Wine Capitals, Global Network (GWC) e WineTourism.com.
Neste estudo foi considerada uma amostra de 1.310 empresas produtoras de vinho, de 47 países (70% da Europa e Cáucaso e do 30% do resto do mundo), com o objetivo de suprir a lacuna de dados globais sobre enoturismo, fornecendo contributos para a formulação de políticas e estratégias setoriais.
As empresas participantes são maioritariamente de pequena dimensão, enquanto as grandes empresas representam menos de 10% da amostra, não se registando grandes disparidade entre a Europa e o resto do mundo.
Impacto económico do enoturismo
A grande maioria dos inquiridos considera que o enoturismo tem um papel significativo (40%) ou muito significativo (20%) no impacto económico da sua região. Cerca de 27% dos inquiridos descreveu o impacto como moderado, sugerindo uma visão diferenciada consoante a localização. Apenas uma pequena minoria classifica o impacto da atividade como sendo mínimo (9%) ou residual (3%), transparecendo que uma baixa perceção é rara.
As empresas de fora da Europa tendem a avaliar o impacto do enoturismo de forma mais positiva. Em contraste, a diferente dimensão das empresas não é fator decisivo quanto à avaliação que fazem, verificando-se uma homogeneização das respostas.
A grande maioria das empresas respondentes (88%) declararam oferecer atividades de enoturismo, o que reflete a predisposição largamente maioritária de se empenharam na oferta deste tipo de serviços. Entre as empresas que não prestam serviços de enoturismo, as razões mais apontadas são a não disponibilidade de pessoal (50%) e a falta de tempo (46%). Outros fatores apontados são a inexistência de uma procura que o justifique, a incompatibilidade com a filosofia da marca e o não ser suficientemente rentável.
A maioria das adegas oferece enoturismo há mais de 10 anos, sendo essa proporção mais elevada nas regiões fora da Europa (60%) do que no continente europeu (49%).As adegas europeias apresentam quotas ligeiramente superiores nas categorias de 1 a 5 anos (28%) e 6 a 10 anos (19%) em comparação com outras regiões mundiais. Assim, os resultados sugerem que o enoturismo se desenvolveu primeiro noutras regiões mundiais e só mais tarde na Europa.
Outro aspeto analisado é o que relaciona a dimensão das empresas e o tempo em que estas têm vindo a oferecer atividades de enoturismo.. Embora a maior parte do conjunto de empresas inquiridas já tenha atividades de enoturismo há mais de 10 anos, a percentagem de respostas é mais alta quanto maior for a dimensão. Pelo contrário, das pequenas empresas, cerca de 35% entrou nesta atividade há menos de 5 anos.
Já no que se refere ao tipo de atividades proporcionadas aos visitantes o top-3 é ocupado pelas provas de vinho (79%), visitas às caves (68%) e visitas às vinhas (61%). Experiências gastronómicas, designadamente pairings entre vinho e comida são oferecidos por metade das unidades respondentes (49%). Atividades de maior interação cultural, como encontros com os produtores ou eventos privados, também são bastante comuns (46%). Em contraponto, atividades conectadas com uso de tecnologia, como visitas virtuais (6%) ou provas online (11%) permanecem raras.
De resto, a oferta de atividades parece estar adequada às preferências dos consumidores, sendo as provas de vinho (56%), as visitas às caves (41%) e as visitas às vinhas (31%), as atividades mais apreciadas. De assinalar igualmente outras experiências, como as food parirings (29%) e os encontros com os produtores (21%), que se encontram entre as preferidas. Já as visitas virtuais (3%) ou as provas online (5%) têm níveis de adesão muito baixos.
Visitantes
O número anual de visitantes repostado pelas diferentes unidades de enoturismo, varia entre o mínimo de 10 e o máximo de 250.000. A mediana situa-se em torno dos 1500 visitantes/ano. A maior parte dos visitantes são nacionais (65%) e os restantes (35%) são internacionais. Em Portugal, a situação é oposta, com 60% de visitantes internacionais e 40% nacionais, segundo os resultados obtidos pelo inquérito às empresas de enoturismo realizado pelo Turismo de Portugal.
No que respeitas às faixas etárias que mais procuram este produto, a esmagadora maioria situa-se entre os 25 e os 65 anos.
Tal como já demonstrado por estudos anteriores, a maior parte dos visitantes de unidades de enoturismo não são especialistas, nem têm especial conhecimento sobre vinho, sendo que 75% tem conhecimentos médios e 19% baixo conhecimento. Apenas 6% dos visitantes têm conhecimentos robustos sobre vinho.
Algumas das tendências de procura de enoturismo, são pronuncio de algumas alterações no perfil do futuro visitante, mais jovem, mais interesse por aprofundar os conhecimentos sobre vinho, focado na sustentabilidade, nas experiências gastronómicas e no luxo.
Estrutura das empresas, Rentabilidade, Investimento e Desafios do setor
A maioria das empresas (61%) são de pequena dimensão, tendo ao seu serviço 1 ou 2 colaboradores afetos à atividade de enoturismo. Pelo contrário, apenas 16% das empresas respondentes declarou ter mais de 5 funcionários afetos a esta atividade. A maior parte das empresas com mais colaboradores em enoturismo situam-se fora da Europa. No continente europeu a maioria das empresas (69%) declarou ter até 2 funcionários para esta área de atividade.
Do conjunto de empresas que responderam ao inquérito realizado, 65% consideram o enoturismo rentável ou muito rentável (média 3.7/5), contra apenas 7% que a consideram como atividade não rentável.
A nível global o enoturismo representa cerca de 25% da receita total (32% fora da Europa, 23% na Europa) das empresas inquiridas, tendo um peso relativo maior nas pequenas empresas, sendo responsável por uma maior proporção de receitas (28%). Em Portugal e de acordo com o inquérito efetuado pelo Turismo de Portugal, o enoturismo representa cerca de 20% do total da faturação.
Estes resultados poderão estar diretamente associados às respostas obtidas sobre a predisposição sobre investimentos futuros, com mais de metade (51%) das empresas a referir ter intensão de proceder a novos investimentos em enoturismo, enquanto apenas 16% afirmam claramente não estar a considerar essa possibilidade.
Quando inquiridas sobre o futuro do enoturismo em diferentes dimensões (região/ própria empresa/ajuda em tempos de crise) 68% acreditam que crescerá na sua região, 73% acreditam que as suas próprias atividades crescerão e 60% acreditam que poderão dar um contributo positivo em tempos de crise.
As empresas europeias acreditam mais no futuro da atividade nas próprias empresas e respetivas regiões de origem, mas tendem a olhar menos para esta atividade como ajuda em tempos de crise, mais valorizada noutras regiões mundiais.
São de várias naturezas os principais desafios que se colocam aos futuros desenvolvimentos do enoturismo. A diminuição do consumo de vinho e as pressões económicas (ambas sinalizadas por 51% das empresas) são encarados como os mais significativos, seguidos pelas alterações nas preferências dos consumidores mais jovens (40%), a deslocação e acessibilidade dos visitantes dentro das regiões (39%) e as restrições de saúde e polícias de consumo de álcool (38%).
Na Europa as maiores preocupações focam-se na sustentabilidade e regulamentação. Já fora da Europa teme-se o impacto de crises económicas e a diminuição do número de turistas.
Sustentabilidade
Curiosamente, ou não, a importância da sustentabilidade do enoturismo é bastante mais valorizada pelos produtores (67% consideram importante ou muito importante) do que pelos visitantes (apenas 41% considera importante). Espera-se que num futuro de médio prazo, nos próximos 5 anos, esta opinião possa ser partilhada por 61% dos visitantes.
Tendências e Inovação
O conhecimento e domínio antecipado sobre os caminhos de futuro de qualquer atividade são da maior importância para investidores e empresários de qualquer área de negócio. O enoturismo não é exceção e nessa medida importa tentar perceber quais as tendências do futuro em termos de comportamento e preferências dos consumidores, regulamentação da atividade, ou desenvolvimento da situação económica. A autenticidade da experiência e o carácter local aparecem como principal fator crítico de sucesso (63% de referências), seguido das experiências personalizadas ou de nicho (61%) e do crescimento do interesse por experiências gastronómicas (59%). Um segundo grupo de tendências inclui a crescente procura por práticas sustentáveis (50%), interesse nos valores naturais e biodiversidade (48%) e a expansão da utilização de ferramentas de social media (41%). Aspetos mais tecnológicos como a utilização de informação sobre os clientes (data Analytics) ou a utilização de Inteligência Artificial para personalização das experiências são fatores menos considerados.
A inovação é reconhecida como sendo absolutamente necessária para o enoturismo. O ser inovador traz vantagem competitivas neste segmento de mercado e ajuda a atrair novos tipos de visitantes para as adegas. Apesar deste reconhecimento, o atual investimento em desenvolvimentos do negócio é moderado, revelador de uma discrepância entre pensamento e ação.
Conclusão
Em 2025, o enoturismo à escala global é um segmento consolidado e rentável, especialmente para pequenas empresas produtoras de vinho. Responde com inovação contínua aos desafios que se colocam, designadamente, pressões económicas e mudanças no comportamento do consumidor.
O enoturismo demonstra uma tendência de crescimento sustentável, apoiado em autenticidade, gastronomia e educação vínica. A procura por experiências diferenciadas e personalizadas reforça a importância da ligação entre o vinho, o território e a cultura local, promovendo uma valorização transversal das comunidades e dos destinos.
O futuro aponta para maior integração tecnológica, uma personalização da experiência e um reforço da sustentabilidade como pilares centrais do desenvolvimento. Estes fatores, aliados à criatividade e à inovação, serão determinantes para garantir a competitividade e a relevância do enoturismo no panorama turístico e económico mundial.