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Publicação

abril 04, 2024
Pedro Pereira
Cruise Lines International Association , Statista

Procura de cruzeiros atinge a retoma plena após efeitos devastadores da pandemia

turismo internacional

A resiliência das companhias de cruzeiros teve um teste duríssimo durante o período pandémico. No início da globalização do processo pandémico, foram vários os casos noticiados de pessoas infetadas a bordo de navios de cruzeiro, a total ausência de conhecimento sobre formas de atuação e mesmo a proibição de navios com pessoas infetadas atracarem em muitos portos. Aquele cenário levou à paralisação completa de toda a atividade a nível global, desde março de 2020, basicamente até ao final de 2021. Apesar deste fortíssimo constrangimento, e como a construção de novos navios obriga sempre a prazos muito alargados, a capacidade operacional de cruzeiros está a caminho de exceder o nível de 2019 em 16% durante o corrente ano.

Durante 2022, a retoma foi-se verificando de forma progressiva, tanto do lado da oferta, como do lado da procura. Até ao final de 2022, a totalidade dos navios oceânicos dos membros da CLIA (Cruise Lines International Association) tinham voltado a navegar e foi ultrapassada a marca dos 20 milhões de passageiros. Ao longo do último ano (2023), a procura por cruzeiros continuou a aumentar, ultrapassando os níveis de 2019, atingindo assim um novo valor máximo de passageiros transportados num único ano: 31,5 milhões

Um fator que aparenta ser determinante nos bons resultados, em termos da recuperação já registada, é o elevado grau de satisfação dos utilizadores deste produto. Segundo as conclusões de um inquérito realizado pela Oxford Economics, existirá uma ligação direta entre o elevado grau de satisfação com os serviços prestados e a fidelização da procura, designadamente, através da repetição da utilização de serviços semelhantes.

O impacto da pandemia de Covid-19 sobre esta atividade repercutiu-se de forma avassaladora na faturação das empresas. Em 2020, com a suspensão completa das atividades a partir de meados de março, a faturação anual decresceu quase 90% face a 2019 e obviamente em 2021 a evolução ultrapassou os 300% dado que a base de partida tinha sido muito baixa. Em 2022 e 2023, as taxas de crescimento das receitas foram bastante interessantes, embora ainda não tenham atingido o valor de 2019, o que se prevê venha a acontecer já a partir de 2024.

Toda a recuperação do volume de negócios das empresas de cruzeiros estará ainda relacionada com o facto do estigma da pandemia estar completamente ultrapassado pelos potenciais passageiros de cruzeiros, sendo inferior a 10% as pessoas que se afirmam menos interessadas neste produto, por causa da pandemia.

O Mercado Europeu de Cruzeiros

Na Europa, o mercado de cruzeiros foi fortemente perturbado pela pandemia, em 2020, que nos diferentes mercados nacionais teve reduções superiores a 80%, chegando a ultrapassar os -90% em Espanha, tendo o mercado português descido -88%. Em 2021, registou-se uma ligeira retoma, com alguma recuperação da procura na maioria dos mercados europeus e 2022, veio reforçar substancialmente a procura, embora em nenhum dos mercados europeus se tenham atingido os números de 2019. 

Figura 6 – Evolução da procura por cruzeiros na Europa, 2019-2022

Fonte: CLIA, 2023

Os destinos europeus lideram entre as regiões mundiais com maior procura de cruzeiros. O Mediterrâneo e a Europa do Norte, designadamente a Escandinávia, são os segundo e terceiro destinos mundiais, respetivamente, apenas superados pelas Caraíbas.

O Mercado Nacional de Cruzeiros

O mercado nacional de cruzeiros também foi severamente afetado pela pandemia. Esta era uma atividade em crescimento sustentado até 2019, valendo então cerca de 55 milhões $US, e em 2020 teve uma retração superior a 80%. Tal como no mercado global, e apesar das intermitências no serviço verificadas em 2021, a faturação triplicou e em 2023 praticamente atingiu o valor de 2019, que segundo as projeções será ultrapassado em 2024.

O crescimento do segmento de luxo

O segmento de luxo tem tido um crescimento muito significativo, claramente superior ao conjunto da atividade, tendo quase duplicado a capacidade de oferta nos últimos cinco anos, em resposta ao aumento da procura por esta categoria de serviço. Apesar deste rápido crescimento, o segmento de luxo ainda é apenas uma pequena parcela do mercado, estimando-se que venha a representar cerca de 6% do total de passageiros de cruzeiros em 2028.

Neste cenário, é previsível um forte aumento da concorrência neste segmento, como o aparecimento de novos operadores de cruzeiros de luxo. Na verdade, os cruzeiros de luxo tornaram-se tão procurados que muitas marcas conceituadas na hotelaria tradicional como a Ritz-Carlton, a Four Seasons e a Aman lançaram recentemente as suas próprias ofertas de cruzeiros com as respetivas marcas.

Este desenvolvimento está também a ter consequências na construção de novas embarcações, tanto de grande porte, sendo comum o anúncio de entrada ao serviço de alguns dos maiores navios do mundo, como de pequeno porte, tendo em vista o aumento de capacidade de restos a uma procura de nicho, combinando comodidades luxuosas e conforto extremo, produtos mais personalizados e experiências mais autênticas, normalmente oferecidas para grupos relativamente reduzidos.

O desafio da sustentabilidade

Apesar dos desafios dos anos mais recentes, as empresas de cruzeiro continuaram a assumir uma agenda ambiental ambiciosa, procurando tornar as suas frotas mais eficientes e sustentáveis. As companhias de cruzeiros membros da CLIA estão comprometidas com os valores da sustentabilidade e, como parte desse esforço, têm como objetivo alcançar a meta de “emissões zero” até 2050, apoiando assim o projeto de longo prazo da sustentabilidade da indústria. Para conseguirem esse desiderato as empresas de cruzeiros procuram desenvolver projetos de navios mais eficientes, a adoção de combustíveis alternativos e o uso de tecnologias digitais.

Em 2023, o navio de cruzeiro MSC Euribia completou o que é descrito como a primeira viagem da indústria com emissões líquidas zero de gases com efeito de estufa. Cerca de 400 toneladas de gás natural bioliquefeito foram compradas para esta viagem simbólica. 

Também nesta matéria deve ser tido em conta o papel pioneiro da União Europeia na busca da redução das emissões em todo o setor marítimo, incluindo um sistema de comércio de emissões (ETS), um regime que atribui um preço às emissões de carbono, bem como a iniciativa marítima FuelEU, que visa reduzir gradualmente a dependência dos combustíveis tradicionais a partir de 2025.

A investigação em matéria da industrialização de células de combustível, que sejam capazes de capturar até 90% das emissões de carbono de um navio de cruzeiro ou a instalação de eletricidade em terra para a ligação dos navios de cruzeiro de modo a permitir que os navios desliguem os seus motores e cortem as suas emissões enquanto estão acostados são exemplos de alguns dos progressos que já estão a ser tentados, com vista a uma próxima adoção generalizada pelos navios de cruzeiro.

Caminhos de futuro para os cruzeiros

⭢ A atividade global de cruzeiros está a atingir níveis recorde, com as Caraíbas a registar uma forte recuperação e o Mediterrâneo a manter a sua quota de mercado;

⭢ Segundo os dados disponíveis de reservas, a vontade dos consumidores utilizarem cruzeiros permanece em alta e a procura mantém o ritmo de recuperação, apesar da conjuntura económica débil;

⭢ Os níveis de ocupação estão rapidamente a aproximar-se dos níveis pré-pandémicos, sendo expectável que os próximos anos venham a registar níveis máximos históricos, de forma consolidada; 

Sustentabilidade do negócio: a indústria dos cruzeiros está a investir em tecnologias mais amigas do ambiente, a tentar reduzir os plásticos de utilização única e a trabalhar com os destinos para diminuir o seu impacto ambiental; 

⭢ Além dos navios de grandes dimensões, há uma procura crescente por cruzeiros boutique que visitam locais menos conhecidos;

⭢ As empresas de cruzeiros procuram satisfazer a necessidade dos passageiros por experiências genuínas, oferecendo planos de viagem que familiarizam os visitantes com a história e a cultura dos destinos que visitam;

⭢ As empresas de cruzeiros estão a tentar captar uma ampla gama de preferências através de cruzeiros temáticos e de aventura. Experiências especializadas podem incluir refeições requintadas, aventuras, viagens de saúde e programas focados em hobbies específicos; 

Transformação Digital: a tecnologia está a transformar toda a experiência a bordo. Personalização baseada em IA (Inteligência Artificial), tecnologia utilizável a bordo para compras, acesso sem chave e conectividade Wi-Fi melhorada são alguns exemplos;

⭢ Tecnologias avançadas de comunicação como a realidade virtual e a inteligência artificial (IA) estão já a desempenhar um papel determinante no turismo de cruzeiros, prevendo-se a sua expansão no futuro imediato. As agências de viagens podem utilizar esta tecnologia para conhecer os interesses dos passageiros de cruzeiros e criar oportunidades para potenciar o aumento das vendas;

⭢ Com entretenimento e atividades para todas as faixas etárias, incluindo cruzeiros para toda a família, as empresas de cruzeiros estão a expandir as suas ofertas e descontos para acomodar visitantes que viajam em grupos.

Fontes: CLIA, 2022 Europe Market Report; Euronews; Forbes; GlobalData, Key Trends in Cruises (2024), 2024; Oxford Economics; Statista Mobility Market.